quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Diria adeus...2


Lud
...Em frente aquela máquina – distâncias encurtadas por um mundo virtual que me anulava constantemente – recebia sua partida, sem sequer haver chegado, como um súbito e paradoxalmente aguardado soco na boca do estômago. Olhava para o que me restava de você, traços momentaneamente retidos, no lugar de passagem em que o aeroporto havia se constituído. Me doía inumana e agressivamente te imaginar com ela...Aisla! Me odiava por não saber lidar com sua falta – dessa feita legitimada, pelo maldito termo (namorando?) que desprendendo-se, brincava em frente aos meus olhos marejados. Gosto de sal na boca!Olhava para as paredes brancas a minha frente, como se a procura de Deus, ou qualquer coisa que curasse essa ausência de ti em mim. Não o via, nem fadas, ou silfos, apesar dos milhões de incensos acesos, sequer salamamandras brincando perigosas nas chamas que projetavam formas, quem saberá se as suas? Daquele dia em diante, nunca mais as vi, nada restou além desse vórtice em que me enredava, além desse gosto seco na boca e da vertigem em me saber definitivamente ausente da vida que quis minha.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Mudei-me da casa dos eruditos e bati a porta ao sair. Por muito tempo, a minha alma assentou-se faminta à sua mesa. Não sou como eles, treinados a buscar o conhecimento como especialistas em rachar fios de cabelo ao meio. Amo a liberdade. Amo o ar sobre a terra fresca. É melhor dormir em meios às vacas, que em meio às suas etiquetas e respeitabilidades."Nietzsche

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

voragem, vertigem, vértice...dor...


"Os sentimentos que mais doem, as emoções que mais pungem, são os que são absurdos - a ânsia de coisas impossíveis, precisamente porque são impossíveis, a saudade do que nunca houve, o desejo do que poderia ter sido, a mágoa de não ser outro, a insatisfação da existência do mundo. Todos estes meios tons da inconsciência da alma criam em nós uma paisagem dolorida, um eterno sol-pôr do que somos...O sentirmo-nos é então um campo deserto a escurecer, triste de juncos ao pé de um rio sem barcos, negrejando claramente entre margens afastadas."

Fernando Pessoa

Fotografia: Jessica Tremp

domingo, 11 de outubro de 2009

Agora ela pode ir...


Há um poema assim: "Por que a rosa murchou e caiu / E estes olhos não viram?"Isso me assombra. Mas é um estado de espírito que conheço tão bem. Aquele pesar por aquilo que não se viu e não se sentiu, pelo que passou sem ter sido percebido. A vida nos é dada apenas uma vez, e nós a desperdiçamos. Você sente isso?



K. Mansfield

Fotografia: Daniel Pinheiro



"Aflição de ser eu e não ser outra. Aflição de não ser, amor, aquela Que muitas filhas te deu, casou donzela E à noite se prepara e se adivinha Objeto de amor, atenta e bela. Aflição de não ser a grande ilha Que te retém e não te desespera. (A noite como fera se avizinha) Aflição de ser água em meio à terra E ter a face conturbada e móvel. E a um só tempo múltipla e imóvel. Não saber se se ausenta ou se te espera. Aflição de te amar, se te comove. E sendo água, amor, querer ser terra"
Hilda Hilst


Fotografia: Jessica Tremp

sábado, 10 de outubro de 2009

Da vontade de partir...




"'...ah, essa mulher, essa menina - precisava sair daqui. Deste planeta que, tão freqüentemente, parece não comportar a sensibilidade."

Caio Fernando Abreu






Fotografia: Jessica tremp

Ainda as traduções...


"Queria tanto poder usar a palavra voragem. Poder não, não quero poder nenhum, queria saber. Saber não, não quero saber nada, queria conseguir. Conseguir também não - sem esforço, é como eu queria. Queria sentir, tão dentro, tão fundo que quando ela, a palavra, viesse à tona, desviaria da razão e evitaria o intelecto para corromper o ar com seu som perverso. A-racional, abismal. Não me basta escrevê-la - que estou escrevendo agora e sou capaz de encher pilhas de papel repetindo voragem voragem voragerm voragem voragem voragem voragem sete vezes ao infinito até perder o sentido e nada mais significar - não é dessa forma que eu desejo... Eu quero sê-la, voragem." CFA

Fotografia:Gaena

traduções...


"Para me dar força, escrevi no espelho do meu quarto:' Tá certo que o sonho acabou, mas também não precisa virar pesadelo, não é? ' É o que estou tentando vivenciar. Certo, muitas ilusões dançaram - mas eu me recuso a descrer absolutamente de tudo, eu faço força para manter algumas esperanças acesas, como velas. Também não quero dramatizar e fazer dos problemas reais monstros insolúveis,becos-sem-saída. Nada é muito terrível. Só viver, não é?" Caio Fernando Abreu

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Eu te deixo ir, me deixa ficar então...



Mas havia um quê de refratário naqueles atos, não sabia se no nomadismo que caracterizava seus dias – “Nunca pude ficar”, diria uma vez para alguém que havia se referido a sua constante impermanência, rindo depois do paradoxo que era constante/impermanente...
Lembrava-se de situações tensas e episódicas, como delito oculto que marcara sua vida, desde aquela noite no parque, podia até afirmar; vivia em paz quando a desordem se fez presente, como spot que acende sem esperar, fantasma batido por sombras, desejos irrealizados, quem saberia se irrealizáveis.
Fotografia: Biliana Rakocevic

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

"Vem de repente um anjo triste perto de mim"


"Não iriam entender que vezenquando a gente fica triste sem motivo, ou pior ainda, sem saber sequer se está mesmo triste. Mas podia aceitar, entrar no carro, vamos até à praia? Deitar a cabeça nos braços, apoiar os braços na janela aberta, vento entrando, remexendo nos cabelos, no rosto, jeito de lagrima querendo rolar..."Caio F. Abreu