Quantos sonhos você teve desfeito? Quantas chances eclipsadas em nome de todos os outros de você, porque sempre foi assim viver, deixando-se morrer a cada dia e agarrando-se ao medo que da morte tinhas. Soube desde o momento em que te tive ao meu lado, quando numa adolescência conturbada – como tudo em mim – que você me amparava e fazia estranhas compressas com batatas, que você segurava minha cabeça insone, e me trazia água com açúcar, aquela mesma que eu precisei quando você se foi, que estarias sempre ali. E agora que não escuto sua voz, que não te vejo sorrir desinteressada, ou chorar quando nos despedíamos, me perco de mim por não te ter aqui.
Soube da tua compreensão desmedida, do eterno cuidado comigo, quando casei e separei meio que a tua revelia, não por descontentamento, mas por desconhecimento, porque você sempre adotava os que comigo andavam. E depois que cresci, que voltei, que um pouquinho de mim se foi com você, percebo a real dimensão que ocupaste em minha vida.
Soube de ti pela docilidade/desconhecida com que recebestes a notícia acerca da minha atual condição matrimonial, indecorosa para alguns, enervante para outros, desimportante para ti, na medida em que te via mover-se em função do que me fazia sorrir...E agora, para quem eu ligo quando alcanço essas pequenas vitórias que você tanto exaltava? Como te supor distante e inalcançável, como saudade sem volta?
Então lamento essa dor na alma, isso que nunca passa, e começo a entender de sofrimento, como estalo surdo, e te imagino distante, diáfana, e tenho medo de esquecer de ti. Me angustia a lembrança dos momentos finais, quando tentava te salvar daquela corporeidade corrosiva, e intuía a dor tão temida, e me agarrava ao que restava da tua vida...e te pedia silenciosa e alucinadamente para nunca ir embora daqui, de mim.
Anne Damásio
Existe coisa mais dolorosa que a perda? Seja ela de qual natureza for, imagino, não existir - talvez a morte. E uma avó, então? Eu digo isso porque, ao ler essas linhas, me veio à cabeça a pessoa de minha vó materna, que é madrinha de vela e que mora comigo desde que meu vô morreu. É mãe, também, junto com a minha... é um anjo - eu creio que eles existem! - de carne e osso, que se materializa todos os dias. Um anjo que já sente os sinais do tempo, mas, que ainda é luz pra mim, por sempre ter me apoiado em tudo... Resta-me, agora, por amor a esse anjo-vó-mãe que mora comigo, as lágrimas...
ResponderExcluirEngolindo a dor silenciosamente calculada. A minha vózinha também está viajando por uns tempos. O que mais me dói é ter estado ausente nos dias e na hora do embarque.O que fica é uma mistura de medo de esquecer e necessidade de lembrar como forma de materializar a continuação do cuidado e amor que tinha por mim. Sinto conscientemente sua falta de vez em quanto, naqueles momentos que me dispo de toda aquela coisa de ser forte que você fazia tão bem. Saudades Vóvó Luzia... Saudades Dona Chaga.
ResponderExcluirE se a perda for um recomeço? Uma nova relação ainda que solitária?Uma convivência com algo que ainda não faz parte de nosso entendimento?Mas, que está no único lugar que os outros não podem interferir!Penso em perdas como recomeços.
ResponderExcluir